6.8.15

(des)encontros (capítulo treze)


Não havia bar que o atraísse no caminho de regresso ao hotel. Por melhor que fosse o aspecto exterior. Por mais pessoas que estivessem à porta do mesmo. Por mais sede que tivesse. E por mais dinheiro que tivesse para gastar em mais uma ou várias cervejas. João estava cego. Parecia que vagueava num mundo só seu com ruas feitas no imediato e ao ritmo de cada um dos seus passos. O único ponto de ligação com a realidade era o medo de não ter acesso ao concerto. Independentemente de que a sua certeza em relação à presença de Sophia fosse na realidade uma incógnita.

"Ela vai lá estar! Ela vai lá estar! Ela vai lá estar!", dizia num tom de voz imperceptível. Repetia as suas palavras tal e qual um menino que foi castigado e que está a escrever a mesma frase um vasto número de vezes no quadro e que o faz com afinco e com receio de um novo castigo. Mas, por mais vezes que repetisse aquela frase, não conseguia evitar que surgissem outros dois pensamentos. Um deles num menor número de vezes. "E se está lá mas se não a encontras?", era algo em que pouco pensava porque não concebia essa hipótese. "E se não está?", era algo em que tentava não pensar por ser algo que não conseguia controlar.

Mais do que não controlar, João não queria pensar nisso por saber que era uma hipótese tão válida como a presença de Sophia no concerto. E que caso se verificasse reduzia drasticamente, de acordo com a sua forma de pensar, a probabilidade de se cruzar com Sophia em Dublin. Por isso preferia insistir até à exaustão no "Ela vai lá estar!". E foi assim que fez todo o caminho de regresso ao hotel. Nem sequer reparou nas duas amigas que se meteram consigo e às quais não ligou nenhuma. Tal como a marca da cerveja que tinha bebido, o número de vezes que repetiu a frase permitia que entrasse nos Guiness World Records como a pessoa que mais vezes conseguiu dizer uma frase num determinado tempo.

Já no hotel e num estado que impedia que pudesse relaxar em condições, deu por si a pensar noutro problema. "Se a encontrar, o que lhe digo?", foi a questão que passou a incomodar João. "Olá. Estás recordada de mim? Sou o João, de Portugal? Beijaste-me uma vez na tua despedida de solteira e tenho andado a percorrer Dublin à tua procura. É o que digo enquanto lhe aceno com a mão", ensaiou em frente ao espelho. "Medo!", foi a reacção ao seu ensaio. "Vai pensar que sou um louco", e foge de mim ao estilo do puto do Sozinho em Casa quando decide dar uso ao after-shave do pai.

"Também posso aproximar-me lentamente como se nada fosse e como se nem a tivesse visto. Mas sempre a fazer os possíveis para que repare em mim. Quando isso acontecer faço ar de surpreendido como se tivesse sido obra do destino pois calhou estar por ali", disse. "Esta parece-me uma boa opção. Ou será dos nervos?", prosseguiu como se mantivesse um diálogo com outra pessoa. "Ou então posso fazer como o Jim Carrey no Doidos à Solta. Arranjo um fato laranja e fico de cu empinado no bar a beber champanhe enquanto espero que ela me observe", pensou.

"Vou deixar estas decisões para outro momento. Não gosto de sofrer por antecipação e nem sei se tenho acesso ao concerto", disse, começando o telemóvel a tocar logo de seguida. Zé Manel é o nome que aparece no visor. "Já?!?", exclamou. "Ele disse que provavelmente não dizia nada hoje. Foi tão rápido. Quando assim é as notícias não são boas", temeu. "Estou?", disse muito a medo. "Já tenho uma resposta para ti", disse Manuel do outro lado. "Desculpa mas não consigo fazer nada. Aquilo já está lotado e o pessoal da editora daí já não tem mais convites. Desculpa", explicou.

"Ok...", reagiu João num tom de voz triste. "Já sabia que ia ser assim. Foi tudo inesperado e em cima da hora. Obrigado na mesma", disse. "Mas porque querias ir lá?", perguntou o amigo. "Vim até Dublin à procura de uma rapariga que conheci em Portugal. E acredito que ela vá lá estar. Era a melhor hipótese de a encontrar", desabafou. "Mas podes ir para a porta. Vais cedo e ficas à espera que as pessoas entrem", aconselhou Manuel. "Bela ideia Zé. Obrigado! É isso mesmo que vou fazer", disse com entusiasmo.

"Estava a brincar contigo. E nem precisas de o fazer", referiu Manuel. "Como assim? É a única solução", explicou João. "Era a única solução se o teu nome não estivesse na guest list do concerto", disse Manuel entre risos. "Estiveste a gozar comigo? Isso não se faz", lamentou João. "Não podia perder esta oportunidade puto. Até porque te devo umas quantas deste género. Não foi fácil mas por ti valeu a pena. Espero que a miúda esteja lá e que a encontres. Mas nem tudo é mau se correr mal", disse Manuel. "Como assim?", perguntou João. "O concerto é com bar aberto e numa fábrica de cerveja. É preciso explicar mais alguma coisa?", gracejou. "Muito mas muito obrigado". "Está lá por volta das 21h30 para entrares com calma. Grande abraço e boa sorte", concluiu Manuel.

Ainda não tinha terminado a chamada e já estava a sofrer um novo ataque de "ela vai lá estar!", ainda mais forte do que o anterior. Que se misturava com um novo ataque de "qual a abordagem a seguir". E foi de ataque em ataque que passou o resto do dia. E foi de ataque em ataque que acabou por se deixar dormir. Durante a noite murmurou algumas palavras para Sophia, naquela noite a protagonista de todos os seus sonhos. Já de manhã acordou assustado. Pegou no relógio e reparou que os ponteiros assinalavam as 10h23. "Já estou atrasado", exclamou em sobressalto. Os nervos eram tantos que demorou alguns minutos a perceber que era de manhã. E que ainda faltavam muitas horas para o concerto.

O resto do dia foi passado com mais ataques de "ela vai lá estar!". De resto, com o passar das horas definiu a abordagem a seguir. Aproximar-se de Sophia e contar a realidade, mesmo que corresse o risco de ser visto como um louco que larga tudo para ir atrás de uma mulher que mal conhece. Pelo menos seria sincero e isso nunca pode ser mau. Este era o seu modo de pensar e quando a lucidez se apoderava de si percebia que era o melhor caminho a seguir. As horas foram passando. O concerto cada vez mais perto. E os nervos cada vez mais intensos. Com a intensidade a aumentar a cada segundo que passava.

Chegou a hora de se despachar. Tomou um duche que não só o refrescou como acalmou. Limpou o corpo e atirou a toalha para cima da cama. Desodorizante, creme no rosto e no corpo. Vestiu as jude, as suas skinny jeans da Mango e calçou os ténis All-Star. Borrifou o tronco e o pescoço com o perfume Hugo Boss Red, vestiu uma tshirt branca e colocou a camisa vermelha e preta aos quadrados presa à cintura. Depois, abandonou o hotel rumo ao local do concerto que não era muito longe do local onde estava hospedado.

Eram 21h33 quando chegou à fábrica da Guiness. Deu o nome e entrou sem problemas, ficando com uma pulseira no pulso direito. Ainda teve tempo para visitar um pouco da fábrica antes de ser encaminhado ao local onde ia decorrer o concerto. Um espaço não muito maior do que a área do piso de um qualquer pavilhão desportivo. Numa das pontas estava montado o palco. Na outra existia um bar e a percorrer todo o espaço diversos empregados com bandejas com comida e com vinho. No bar a cerveja Guiness era à descrição. Abordado por um desses empregados aceitou um copo de vinho tinto que bebeu quase de seguida.

Aproximou-se de outra empregada para colocar o copo vazio na bandeja. Quando o fez reparou num grupo de raparigas que estava no bar a beber cerveja. Ainda não estavam muitas pessoas no espaço, o que tornava mais fácil reparar nas pessoas. Mas neste caso foi especial. João não tinha dúvidas. Tinha estado poucas horas com Sophia mas olhar para aquele grupo de amigas no bar foi suficiente para perceber que, mesmo estando de costas, a do meio era Sophia. Só podia ser ela. Tinha de ser ela. Foi aquilo que pensou a cada passo que deu enquanto se aproximou dela. Quando lá chegou, tocou-lhe ao de leve no ombro. "Sophia?", disse. A rapariga voltou-se para João. Era mesmo Sophia. "Sim", respondeu-lhe com espanto no olhar.

10 comentários:

  1. AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAi oh pah... e acaba isto aqui? neste momento? e vai demorar ainda tanto para o próximo... num posso beliebe!!!!
    Ai... obrigada por este momento de descontracção ... mais ou menos... ehehehehe MUITO BOM

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    1. Esta semana deverá sair mais um.

      Obrigado eu pela companhia :)

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  2. Ele encontrou-a mesmo, que bonito :)

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  3. Ahhh que empolgante :) e uma excelente leitura nas minhas férias ;)

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  4. OMG... que bommm... Ele encontrou-a!!!! Mas Bruno... tinhas mesmo de acabar assim o episódio, não é?
    Depois dist,o tudo pode acontecer... ela não se vai lembrar dele...? Lembra-se dele mas já está casada e nem quer saber dele...? Abraça-o e beija-o ali à frente das amigas...?
    Hum... quantos dias vou ter de esperar para ler o próximo capítulo???
    Beijinhos e obrigada!

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    1. Um pequeno dado. Ela ainda não está casada. Isto já está na minha cabeça. O resto não sei :)

      Esta semana deverá haver mais um!

      Beijos e obrigado eu.

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